PASSADO:

No Natal de 2016, chamei meu cunhado Felipe e sua câmera. Passamos uma manhã tirando fotos de bebês e bolinhas de Natal. Eu segurava os enfeites e ele clicava. Penduramos as fotos na árvore de Natal, na entrada da UTI. Eu amei a experiência.

Quase 1 ano depois, fiz um curso básico de fotografia e comprei uma máquina bacana. Insegura, chamei minha professora Kat e sua amiga Natália para repetir a sessão. Dessa vez, imprimimos as fotos em grandes painéis para decorar a unidade. Estão lá até hoje, os prematurinhos, Heitor,  Maria Antônia e outros.

Em 2018, fui trabalhar com crianças maiores, do outro lado da cidade, no Hospital Brasília. Me arrisquei em algumas fotos no nosso primeiro Natal.  Pedi a ajuda da amiga Agnes, colega de curso de fotografia. Montamos um painel na parede, e depois outro e mais outro, sempre em datas comemorativas. Um dia, ganhamos um quadro de vidro, presente e bronquinha do hospital, parem de pregar fotos na parede!

Carnaval 2019
Páscoa 2022

Fotografar é colocar na mesma linha, a cabeça, o olho e o coração.

Henri Cartier-Bresson

Em pouco tempo, virou rotina e expectativa. A equipe já perguntava sobre o próximo dia das mães, dia das crianças.  No ano de 2019, cobrimos quase todas as festas do calendário. Em 2020, tivemos uma pausa devido a pandemia. Entrar e sair dos quartos passou a ter mais regras. Agnes precisou se afastar por um problema de saúde, era arriscado se expor. Voltamos aos trabalhos em 2021, ainda com restrições.

Em 2022, fui convidada pela Dra Camila Solé, uma das organizadoras do Congresso Brasileiro de Medicina Intensiva, a expor algumas fotos. Os painéis ficaram no lounge da Associação de Medicina Intensiva. O lugar ficou perfeito, exceto pela falta de espaço para as descrições das fotos. A solução foi criar um QR code, sugestão da amiga Vicky. Meu querido primo Renato me ajudou na criação do site, às pressas. Com o espaço de sobra, fui cutucada a expor alguns textos ao invés de uma informação resumida sobre cada foto. Eu já escrevia sobre pacientes e histórias da UTI quando me inscrevi em um curso de escrita criativa em 2017. Meus textos já foram dever de casa, projeto e terapia. Eu tinha 30 fotos e 3 histórias, escrevi mais 5 em uma semana, e com coragem, postei!

No primeiro dia de exposição, congressistas e palestrantes passaram pelo lounge e pelas fotos. O QR code funcionou e durante os 3 dias de conferência, site foi visitado cerca de 2 mil vezes em diversos países.

PRESENTE:

Uso a desculpa da foto para conversar mais com as famílias. Enquanto nos preparamos e durante a sessão, podemos esquecer, por alguns minutos, as propostas e boletins médicos. Naquele instante, o assunto é outro.

Sou uma médica-fotógrafa ou fotógrafa-médica, depende da hora e da necessidade. Uso da minha intimidade com os equipamentos para fazer composições mais interessantes, sem pôr ninguém em risco, claro. Ajudo a esconder sondas e esparadrapos, disfarço detalhes com desfoques na pós produção, ou apenas coloco um bichinho de pelúcia ali por cima.

Uma vez, mudei o cenário hospitalar com fundo de parque, pista de skate, espaço sideral, até fundo do mar. Ficou lindo e bem amador, mas desisti antes de melhorar. Descobri que gosto mais de contar verdades, do meu jeito. Vejo beleza em dispositivos que salvam, eletrodos e alarmes que me informam, alertam ou acalmam.

Fotografar é atribuir importância

Susan Sontag

Estar na UTI é um momento delicado para todos os envolvidos, mas a fotografia e a escrita podem sugerir uma experiência menos traumática. Podemos contar sobre quem esteve lá, sobre o que aconteceu, sobre a dor que já passou. Fotografar ou escrever é sobre tentar escolher uma memória positiva ou ressignificada: família, esperança, acolhimento ou gratidão.

Em muitos anos de pediatria, posso identificar algumas narrativas e até adivinhar alguns desfechos. Reconheço momentos marcantes, como cenas de filmes clássicos, eu observo, para contar diferente. Eu me lembro de uma viagem, de cima de um morro, o guia disse, eu vejo o pôr do sol todos os dias, nunca é igual. Daí, ele apontou para uma nuvem que parecia uma espada. disse, essa nuvem, nunca vi. Eu sempre me lembro dessa observação, a combinação de luzes, cores e nuvens é sempre inédita para cada nascer ou pôr do sol. Para descrever as nuances, é preciso delicadeza, atenção e silêncios.

Escrever é um modo de não mentir o sentimento.

Clarisse Lispector

PRESENTE 2025:

Dona Mercedes, avó de Ana Júlia, minha paciente querida da vida, me mandou uma mensagem de ano novo: que em 2025 eu pudesse dizer “caramba, estou vivendo o melhor ano da minha vida”. Parece que ela acertou!

Acabei um tratamento de 1 ano e meio, após cirurgia, quimioterapia e imunoterapia. Recebi a última dose em junho. Sim, estive do outro lado e um dia, quem sabe, conto a história completa. Estou bem de saúde e pronta para os novos desafios.

Em julho, estreei 2 exposições! No Congresso de Medicina Intensiva Pediátrica, em Belo Horizonte e no SESC Brásilia da 504 sul. Quando eu poderia imaginar?

Congresso de Medicina Intensiva Pediátrica Belo Horizonte 2025

Para a exposição do SESC, tivemos 2 encontros lindos com as famílias. Contamos algumas histórias, relembramos momentos difíceis. Publiquei sobre cada participante no Instagram, foi muito emocionante e nem sei quando farei isso de novo, preciso me recuperar.

FUTURO:

Para o futuro? Manter a produção no site e fotos no Instagram @naqueleinstante, onde conto um pouco sobre a minha rotina e a da UTI.

No mais, novos encontros, novas fotos e exposições, concursos fotográficos e literários, novas histórias e quem sabe, um livro?